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Instituto dos Cegos da Paraíba completa 75 anos de fundação

Primeira escola para deficientes visuais do Estado supera crise e amplia leque de serviços especializados na capital
publicado: 22/05/2019 10h26, última modificação: 22/05/2019 10h30

Dina Melo

A primeira escola para pessoas com deficiência vi­sual criada na Paraíba com­pletou em maio 75 anos de existência. O Instituto dos Cegos da Paraí­ba Adalgisa Cunha (ICPAC), primeira casa de reabilitação para aqueles que nasceram cegos, ou perderam a visão durante o curso da vida, rea­liza em torno de 5 mil aten­dimentos por mês nas insta­lações localizadas no Bairro dos Estados. É uma vitória ainda mais notável conside­rando que a casa esteve pres­tes a fechar as portas por fal­ta de recursos, em 2008.

Adalgisa Cunha batiza o instituto devido a sua longa dedicação em prol dos cegos - muitos relegados à situação de miséria nas ruas e sem direito a qualquer forma­ção educativa ou profissio­nal. Inspirada no modelo do secular Instituto Benjamin Constant, no Rio de Janeiro, ela decidiu abrir o ICPAC em João Pessoa em 1944, que começou funcionando como internato.

"Muitas famílias que vinham do interior não tinham como acompanhar na capital o desenvolvimen­to escolar dos filhos - tam­pouco as suas cidadezinhas de origem reuniam as con­dições de oferecer um bom ensino adaptado. O internato era uma saída", compara José Antônio Ferreira Freire, presidente da instituição, que ficou cego aos 16 anos após sofrer uma queda numa partida de futebol. Este regime de ensi­no, consolidado no Brasil até as últimas décadas do século passado, se dissolveu para dar lugar à atual visão de en­sino inclusivo, com todos os alunos frequentando a mes­ma sala de aula.

Kelly Silva, 26 anos, fre­quentou o instituto entre 2008 e 2009. Entrou quando tinha 15 anos e ainda enxer­gava; a distrofia na retina e a retinose pigmentar acaba­ram por deixá-la cega. "Mo­rar no internato foi como aprender a desbravar um mundo novo. Até chegar lá, lidava com muito bullying na escola devido à deficiência", lembra. No instituto, Kelly foi alfabetizada em Braille, co­nheceu o goalball e aprendeu atividades que lhe ajudaram a desenvolver a autonomia. Foi lá onde também conhe­ceu o futuro marido, Ibrain, também cego. "A estranheza de sair de casa [onde vivia com a mãe e três irmãs] foi logo superada pela sensação de estar entre iguais. Estar na instituição me estimulou a seguir os meus sonhos e que, para alcançá-los, nada me se­ria impeditivo", reconhece a moça, prestes a se formar em Turismo.

 

Visão inclusiva

 

O ICPAC não atende ape­nas os deficientes visuais, como também crianças com microcefalia, déficit intelec­tual e alguns casos do trans­torno do espectro do autismo. "Recebemos de bebês até ido­sos com uma equipe multidis­ciplinar, que consta de clínico, oftalmologista e psiquiatra, mais enfermeira, psicólogo, assistente social, pedagogo, psicopedagogo, educador físi­co, musicoterapeuta, terapeu­ta ocupacional, fonoaudiólogo e fisioterapeuta", lista Valéria Carvalho, vice-presidente.

Os serviços abrangem um rico espectro, condizen­te com as especificidades do universo da deficiência. Incluem apoio psicológico (para o usuário e família), psicoterapia, estimulação visual, ensino do Braille [sis­tema de escrita em alto re­levo em que cada caractere em tinta corresponde a um sinal perfurado numa célula de três linhas por duas colu­nas] orientação e mobilidade, musicoterapia, atividade mo­tora, esporte (natação, fute­bol de 5, goalbool, atletismo, judô e capoeira), além de ou­tras atividades.

Atualmente, a ONG se sustenta por meio de convê­nios firmados com as Secre­tarias de Saúde e Educação de João Pessoa e de Desen­volvimento Humano Social, do Estado. Mantém proje­tos de empregabilidade de 78 pessoas com deficiência, segundo Valéria Carvalho, e projetos com o Ministério Público do Trabalho e Tribu­nal de Justiça. Ainda assim, também precisa de doações (o telefone para contato é 3244-6220).

 

Afeto com o passado

 

"O instituto foi a casa que me acolheu entre 1990 e 2005, época em que ainda existia o internato. Como era de Itabaiana, só voltava para a minha família a cada 15 dias. Sou eternamente grata por tudo o que aprendi, por­que esta vivência construiu a base para a minha formação em pedagogia, a profissão que hoje exerço", reconhe­ce Mileide Moreira, 34 anos, hoje em busca da segunda graduação, em Jornalismo.

"Perdi a visão aos 10 anos de idade. A minha família ainda tentou algumas cirurgias de reversão, sem sucesso. Cheguei ao ICPAC em 1989, aos 13, para continuar os es­tudos - desta vez sem a visão. E posso dizer que foi lá que aprendi a ressignificar como seria a minha vida a partir de então: me tornei independen­te com as aulas de orientação e mobilidade, me envolvi com a música - mas foi principal­mente no esporte que encon­trei a minha vocação [Legy foi campeão nacional três vezes no Futebol de 5 e represen­tou a Seleção Brasileira de Goalball como pivô por dez anos, onde correu o mundo, conquistando o Aberto de 2006 na Argentina e o bronze no Mundial no Brasil, um ano depois. Ainda hoje pratica os dois esportes]", ressaltou Legy Pedro Freitas, 42 anos.